Bem-vindo a pagina dos colecionadores de frutas!

 

Relatório da ultima expedição em resgate das

frutas realizada em 12 de abril e 12 de maio de 2.009 nas florestas e cerrados remanescentes do Distrito do Rechã, Itapetininga, SP

Leia o relatório da primeira coluna e depois da segunda coluna

 

   Depois de conhecer o Irmão de Fé, Joaquim e conversarmos, observamos que temos gostos em comum tais como as matas, as frutas, os bichos e todas as obras criativas de Deus!

   O conhecimento sobre as nossas matas, bichos, frutas e ervas medicinais está se rareando e a maioria dos ‘cientistas’ estão botando tudo a perder por tolamente aceitarem somente suas experiências e resultados como verídicos, em vez de ao menos registrarem o conhecimento do povo humilde que conhece na pratica os valores da natureza!

   Com esse objetivo em mente o projeto “Colecionando Frutas” faz expedições em resgate as plantas e ao conhecimento dos povos com respeito aos nomes, usos e histórias relacionadas a nossa flora!

   Quando conversei com o Joaquim, observei que poderíamos fazer um bom trabalho juntos e assim combinamos nossa primeira expedição em visita aos cerrados e matas que sobraram em meio a gigantescas plantações de laranjas e de eucaliptos do grupo Citrovita que fica no distrito de Rechã. De onde moro no km 215 da Rod. Raposo Tavares percorri mais 40 km até o distrito de Rechã e então mais 26 km de estrada de terra até a morada do Joaquim. Lá cheguei na noite de sábado dia 11/04/09 e estava curioso para que ao clarear o dia eu pudesse contemplar a paisagem. Na manhã seguinte, pude perceber que a casa do Joaquim fica bem na beira de uma mata que abriga um banhado de onde se tira a água para usos domésticos.

Logo de manhã a conversa sobre frutas do cerrado, pássaros, ervas medicinais estava empolgante. Nesse clima, nos aprontamos vestindo caneleiras para se proteger das cobras, pegando água, um lanche, facão, sacolas para empacotar os materiais encontrados.

   Joaquim contava que há 30 anos atrás tudo era cerrado e o pai dele conhecia uma centena de frutas do campo, as quais muitas vezes era a refeição ou café  da tarde do pessoal que trabalhava na roça. “Hoje infelizmente o cerrado está sumindo”, disse ele, “só sobrou essa fatia embaixo da rede de alta tensão”.

   Felizmente, nesse pequeno escape do cerrado pudemos encontrar muitas plantas interessantes, algumas conhecidas como o Capicurú que aprendi com o Joaquim sobre o chá das raízes que “corta qualquer tipo de diarréias sanguinolentas” e outra fruta pouco valorizada chamada de Fruta de Ema ou Angelim branco no livro Arvores Brasileiras, do qual não apresenta o nome indígena que aprendi ser chamado de Cotó ou Cotoba (Couepia grandiflora). O Joaquim contou que seu pai (ele também) faz suco com a polpa desse fruto com leite ou água o que fica muito saboroso e cremoso! Então coletamos as sementes e frutos caídos no chão e ao observar a natureza, notamos que varias sementes roídas por ratos do campo estavam germinando na areia úmida, enquanto as outras estavam inteiras! Chegamos à conclusão que é preciso retirar a casca das sementes e plantar só a amêndoa (de 1 a 3 por caroço) para germinar. De fato nossa observação deu resultado, pois as amêndoas plantadas já estão germinando no Viveiro Saputá. No passado fiz a tentativa de plantar essa espécie com caroço e tudo, mais nenhuma semente germinou, todas apodreceram.

 

   Voltando ao assunto das ervas medicinais, o Joaquim mostrou para mim a Cebolinha de Perdiz, veja a foto abaixo. Ele contou que um homem desenganado pelo médico, que disse que este ia morrer de hepatite, mais foi curado com a cebolinha de perdiz que levei para ele. “é um santo remédio, levanta qualquer moribundo”, basta picar um pedaço do rizoma e deixar num copo de água dum dia para o outro e tomar. Basta tomar 10 dias que cura qualquer tipo de hepatite!

   Os dias passam rápido e o amadurecimento dos frutos não espera ninguém, se passar a época, então é só no outro ano. Eu telefonei para o Joaquim e combinamos chegar ao local onde estava o Araçá branco na terça-feira dia 12 de maio. Na segunda preparei o almoço para levar no dia seguinte e convidei meu assistente Ilson e meu sogro Joaquim. No dia 12 saímos às 7 horas da manha, num dia de intensa neblina e viajamos com cuidado, e chegamos na Casa do mateiro Joaquim as 9:15 da manhã. Depois de acertar os últimos detalhes pegamos à estrada que só ele conhecia, estrada essa de difícil acesso no meio da plantação de Eucaliptos. Depois de andar e andar muito demos por perdido e não era para menos, pois o Joaquim não andava por aquela região por mais de 11 anos. Finalmente encontramos a tal estrada que chegava perto da mata onde estava o Araçá branco. Infelizmente a estrada estava bloqueada por tantos troncos de eucaliptos caídos. Então fui ver a hora e já era 11:45. Resolvemos almoçar e deixar o carro ali. Mal sabíamos o quanto teríamos de andar (percorremos cerca de 10 km de ida e volta), e decidimos percorrer o caminho na beira das quadras de eucaliptos que davam para remanescentes de matas de galeria.

 

Foto que mostra da esquerda para direita o Ilson (meu assistente), o mateiro Joaquim no meio, e eu (Helton Josué) ao lado direito.

 

As matas de galeria dos cerrados são riquíssimas em espécies vegetais, ali observei arvores raras como o Vassourão (Piptocarpa angustifolia) e Embaúba vermelha (Cecropia glaziovi) além de muitas outras arvores raras que não tivemos tempo de identificar em vista da distancia que tínhamos de percorrer. Depois de andarmos mais 3 km achamos uma arvoreta muito rara, conhecida como Algodão do mato, cujas flores segundo o Joaquim são grandes e muito bonitas. O que chamou a atenção de meu sogro Joaquim e do Ilson foi à curiosa forma de casulo do fruto cuja foto está abaixo. Coletamos ramos e folhas para tentar identificar e inúmeras cápsulas para retirar as sementes que medem 3 mm por 1 mm e são de coloração marrom, e plantar no Viveiro de Mudas Saputá.

 

Acima estão as folhas do Algodão do mato  ou Rosquinha e abaixo seus frutos que pude identificar como Helicteres  (do latim, forma helicoidal) guazumifolia (folha igual de guazuma ou mutanba) antes essa família pertencia a Sterculiaceae, hoje é Malvaceae.

 

 

Cebolinha de Perdiz provavelmente uma planta da família das Orquídeas.

          

  

   Continuando no assunto das plantas medicinais, encontramos numa formação primaria um pé de canela sassafrás (Ocotea odorífera) uma espécie que corre perigo de extinção. Eu aprendi com o Joaquim que as sementes são um excelente remédio para gripe. “Basta socar a semente e deixar dum dia para o outro num copo de água e depois tomar em duas vezes, e a gripe foi embora” ensinou ele...

Andamos e aprendemos um com o outro, demoraria muito relatar tudo que vimos e registramos naquela manhã de domingo dia 12 de abril.

   Continuamos nossa caminhada até o tal Araçá branco e estávamos bem cansados, mais as surpresas nos animavam, pois deparamos com uma arvore jovem de folhas enormes (40 por 10 a 15 cm) e pude observar os caracteres que classificam-na como uma Quararibea. Infelizmente a arvore estava num lugar sujo e sombreado pelos eucaliptos e as fotos tiradas não ficaram boas para mostrar. Comentamos – Se tem a filha, a mãe está por perto. Com isso em mente procuramos a mãe, mais não pudemos encontrar. Marquei o local com GPS para retornar no futuro, para encontrar a arvore grande. Ficamos torcendo para que ninguém a corte...

  

  No período da tarde fizemos outra caminhada numa área de cerradão, onde vimos mais plantas interessantes. Só para mencionar, encontramos o pinheirinho ou planta do sal, da família da Beterraba (Amaranthaceae) cuja foto aparece abaixo. A planta seca ao sol ou desidratada no forno e moída no liquidificador forma um pó verde cinzento que é o verdadeiro sal vegetal que traz muitos benefícios a saúde humana, coisa de nossa terra que assim como a ‘Cebolinha de perdiz’ poderia ser estudada pelos nossos cientistas.

 

   Por fim andamos mais alguns quilômetros e chegamos até onde o Joaquim tinha visto o Araçá branco há 11 anos atrás. O mato cresceu e as arvores estavam comprimidas no meio de outras, o que sem duvida prejudicou a produção dos frutos que estava muito reduzida esse ano. Já era quase 4 horas da tarde e a sombra dos eucaliptos nos impediam de ver os poucos frutos que estavam iniciando a maturação. Com a ajuda de um podão cortamos ramos com folhas e frutos, daí pude observar que o tal Araçá branco não tinha nada que ver com os araçás (Psidium ou Eugenia) da família das Myrtaceas. 

Planta Sal da família da Beterraba (Amaranthaceae)

 

   Depois de observar e tocar as folhas notei que esta era aveludada e com nervuras paralelas na face dorsal, como nunca tinha visto tal planta antes, de inicio eu não sabia o que era. Depois comecei a notar os detalhes, daí fiz um pequeno corte na casca e vi que a madeira é vermelha (em indivíduos jovens a madeira é rosa amarelado), em seguida observei se existiam glândulas, domáceas, tufos de pelos, estipulas peciolares (lamina fina); e só então notei as marcas de estipulas caducas intrapeciolares (entre pecíolos) o que caracteriza a planta como pertencente a família das Rubiaceas. Quando cheguei em casa, fiz mais pesquisas e identifiquei o Araçá branco como Veludo branco (Guettarda viburnioides). (Clik para ver o fruto).    

   Mais surpresas estavam a frente, tal como o “Cipó azeitona” que o Joaquim tinha visto pela primeira vez após uns 40 anos de andanças por aquelas matas. Para mim, um apaixonado por frutas e colecionador foi uma descoberta fantástica! Chegamos até o local e logo vimos o tal cipó com os frutos pretos semelhantes a azeitonas. Conversando, o Joaquim disse que o Jacu (Penelope obscura) come avidamente os frutos. Assim fui logo provar a descoberta, o fruto tem uma casquinha fina preta e meio amarga, a polpa é translúcida e rosada, tem gosto que lembra o tarumã (Vitex montevidensis).          

 

   De inicio o sabor é meio amargo, depois fica muito doce, com isso pude imaginar que a planta fosse da família do tarumã e depois de análise minuciosa pude chegar a conclusão que se tratava do gênero Petrea de plantas ornamentais conhecidas popularmente como Flor de São Miguel ou Viuvinha (Petrea volubilis). Após alguns dias encontrei a descrição morfológica do gênero Pétrea e vi que não batia, por isso voltei a pesquisar e corretamente consegui classificar a espécie como sendo do gênero Mendoncia que recebe o nome local de Cipó azeitona ou Tarumã de cipó. Al clicar no link poderão ver mais detalhes. Se você visitante desta pagina tiver mais informações sobre a identificação dessa espécie, por favor me escreva no e-mail frutasraras@uol.com.br

 

 

Foto do tronco e folhas do veludo branco

(Guettarda viburnioides)

  

O dia de outono é curto e já estava na hora de voltar para casa e deixar aquele recanto, ou canto com remanescentes da nossa flora que guardam espécies pouco conhecidas ou ainda nem catalogadas. Antes de ir embora conversamos animadamente sobre as descobertas e descobri que o Joaquim conhecia mais frutas raras e desconhecidas por mim, tal como o “Araçá branco” fruto de 3 a 4 cm que amadurece em maio a julho que não pude decifrar que espécie seria pela descrição feita.

Então combinamos ir até o lugar em outra ocasião conveniente a ser marcada no mês de Maio. (Veja o relatório na segunda Coluna).

 

 

   Finalmente é hora de voltar para casa e com objetivos cumpridos, e mais uma fruteira nativa resgatada para ser cultivada, preservada e estudada no Sitio Frutas Raras!

 

   Quando falei que o nome da planta era Veludo Branco, o Joaquim se lembrou de uma outra fruta que viu na infância a uns 40 km em direção posta de onde estávamos, que é bem semelhante a esta, porém o fruto é vermelho. Provavelmente seja a raríssima Guettarda pohliana conhecida como Veludo Vermelho, que consegui encontrar por acaso em numa vigem que fiz em julho de 2.009

Vista do matagal em frente da casa do Joaquim

 

 

 Novas expedições foram realizadas no segundo semestre de 2.009, clique aqui para ler o relatório!!!

 

 

 

 

 

 

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